Estava escuro, muito escuro, quando abri meus
olhos e avistei o horizonte ermo. Percorri o ambiente descalça e apavorada sem
lembrar o que havia acontecido comigo e por que eu me encontrava dentro de um
cemitério. Após alguns segundos olhei para minha retaguarda e li com
dificuldade um nome escrito em dourado sobre um jazigo de mármore preto, onde
há pouco me encontrava desmaiada. Era muito confuso, algo como: “Alesking
Hamunatrinck”. Não sabia quem era e tampouco me fez lembrar de algo. Então,
pus-me a buscar o portão de saída. De repente, um homem apareceu em minha
frente. Era alto, magro e com feições de rato. Imediatamente indagou-me:
- Senhorita, o que faz por aqui há essa hora?
- Não sei! – respondi atônita – Quem é você?
- O coveiro... Hah! Eu me chamo George. E você?
- Samara. – soou seco.
Não sabia o que estava acontecendo comigo.
Sentia-me estranha; diferente seria a palavra correta. Estava gelada, porém não
sentia frio. Eu podia ouvir, a distância, as veias daquele homem saltitando,
seu coração acelerado, parecia demonstrar que ele tinha tanto medo de mim
quanto eu dele. O que estava acontecendo comigo?
Levei as mãos sobre minhas regiões temporais e
fechei meu semblante demonstrando dor. Ele percebeu que eu não estava bem e,
querendo me ajudar, vagarosamente aproximou-se. Ele também não parecia
sentir-se bem e ao chegar bem próximo de mim, seu nariz começou a sangrar. Com
isso, percebi que aquele homem era hemofílico.
Fui tomada por um desejo insano, queria
possuí-lo de qualquer modo. Em outro tempo me sentiria uma vadia no cio, mas
era algo mais forte do que eu; o queria mais do que tudo. Agarrei-lhe,
acariciei seu pescoço com a lateral da minha face e de repente aconteceu. Minha
mente apagou, parecia que eu havia perdido a memória, na verdade eu havia
perdido o controle do meu eu humano. Quando acordei, alguns flashes de
sobrevivência vampiresca tomaram a minha mente. Em seguida, vi aquele homem no
chão, com a jugular perfurada esvaindo em sangue; não conseguia entender o por
quê. Afinal de contas, quem havia feito aquilo com George?
Levei minha mão direita à boca ao sentir um
gosto estranho, olhei-a e percebi que era sangue. Não é possível! Seria eu a
culpada pela sua morte? Como? Por que eu faria aquilo? E os flashes vampirescos,
por quê?
Absolutamente paranóica, senti algo incomodar
minha boca. Levei a mão até meus dentes e senti meus caninos maiores e super
afiados.
- Não pode ser! – gritei – Será que eu, Samara Montelay, sou uma vampira? Isso não pode ser real!
Corri para o lado esquerdo do cemitério e me
deparei com uma cruz gigantesca, senti-me fraca e parecia que minha carne se
queimava. O céu começara a clarear. Instintivamente procurei proteger-me.
Porém, desesperada, comecei a pensar no que havia feito com George e percebi
que não queria que isso voltasse a acontecer. Preferia a morte a ser uma
assassina eterna. Alimentar-me de sangue era surreal demais para mim. Jamais me
acostumaria. Por isso, me escondi atrás de uma árvore e esperei os primeiros
raios de sol iluminar o dia. Tomei coragem, engoli o choro e corri frente à
cruz. Um raio de sol atravessou-a e atingiu meu peito; senti cada fractal do
meu corpo queimar e se destruir. Assim, gritei o último clamor da minha vida:
- Morro como vampiro, mas recuso-me a viver
como assassina!
(Kim Montebello)
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